ZONA DE CONFORTO
Largar o emprego, fazer uma viagem ao redor do mundo, começar uma atividade física, mudar de visual, são maneiras estimuladas por aí para sair da zona de conforto. Fazer novos amigos, estar em lugares diferentes, deixar de ser introvertido, ter mais contato humano... Um grande banco, em sua propaganda, se mostra disponível a financiar qualquer experiência para sair da zona de conforto. Vende-se que assim, saindo da zona de conforto, você será finalmente feliz. É moda agora ter que sair da zona de conforto. A zona de conforto nada mais é que a repetição dos mesmos condicionamentos, mas ninguém diz que mudar de emprego, fazer uma viagem, seja lá o que for pra “sair da zona de conforto”, ainda mantém a repetição. São criados novos condicionamentos, novas necessidades e, rapidamente, esses também deixam de ser interessantes e a busca pra sair da zona de conforto novamente continua. Mudar de emprego, fazer a viagem dos sonhos, não tira ninguém da zona de conforto, ao contrário, cria a falsa sensação de mudança e felicidade através das alterações exteriores. Através da criação de novas necessidades. Se você não sair da zona de conforto de sempre se repetir, nenhuma novidade ou experiência podem fazer isso por você. Não adianta alterar as circunstâncias se não tonar o inconsciente, consciente. Sem entender quais são as reais motivações, quais os sentimentos e emoções estão escondidos, quais são as intenções por trás e o mais importante: qual o resultado que se pretende alcançar. Para sair da zona de conforto é preciso olhar para si mesmo. Olhar para os condicionamentos, para o tanto de repetições das mesmas reações. As experiências mudam, o círculo de relacionamentos pode mudar, a viagem dos sonhos pode acontecer, a empresa que você sempre quis pode se concretizar, mas você sempre vai se repetir se não sair do padrão de ação mental que cultiva há tanto tempo. O padrão de ação mental é aquele que faz que sempre nos repitamos. Julgando as situações e as pessoas sempre da mesma maneira, acreditando que o que pensamos e entendemos é a verdade, o certo, e assim reagindo a eles sempre igual. Não adianta mudar de país, de família, de emprego. Não adianta comprar roupas novas, fazer uma plástica, emagrecer. Não adianta pegar o empréstimo no banco. Ainda que acumule sucesso e riqueza, aquela sensação de que ainda falta alguma coisa, vai continuar. O que falta é se libertar de si mesmo, se libertar das histórias que você conta pra você mesmo. Se libertar de escolher sempre baseado nos mesmos critérios. De desejar se afastar do que gera aversão e de se aproximar do que gera atração. Esses extremos da dualidade nunca cessam e são eles que nos mantém no jogo da mente. São eles que nos mantém contando nossas histórias preferidas pra nós mesmos. Que tentam nos convencer que de tanto nos repetirmos, uma hora vamos nos sentir felizes, que nossas táticas vão funcionar. A zona de conforto não é esse lugar onde as repetições exteriores acontecem. A zona de conforto é esse lugar de repetição interior. Sair desse lugar, olhar para os acontecimentos sempre de maneira nova, com olhar de descobrimento, navegando pelos domínios do desconhecido, é sair realmente da zona de conforto. É divertido, inesperado, surpreendente, observar a si mesmo, observar como sua mente opera, quais são os padrões que ela aciona a cada situação. O que se vende por aí não é sair da zona de conforto, ao contrário, é acumular mais algumas “necessidades” para fazer a economia girar. Deneli Rodriguez. 29.08.2017
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EMPREENDORISMO AMOROSO
O que mais vejo nos sites de relacionamento e autoajuda é script do que fazer diante de um par amoroso. É preciso ser o que você é, pois é a sintonia que faz a relação. É preciso lutar e estar atento para com o desejo do outro. É preciso não deixar cair na rotina. É preciso ler os sinais, se a pessoa está a fim ou não. É preciso autocontrole. É preciso se deixar levar. Não pode mandar muita mensagem. Tem que demonstrar interesse. Não pode estar muito disponível. Não pode responder a mensagem na hora, vai parecer que você estava esperando. Não pode procurar o outro. Não pode ser muito simpático. Tem que saber a hora certa para falar determinados assuntos. Se a pessoa está com você, só pode falar de coisas boas e sorrir. Ninguém quer encontrar o parceiro para ouvir problemas. Se a pessoa quer uma coisa que você não quer e você não fizer o que ela quer, ela vai partir pra outra. Agradar e prever o que o outro quer é imprescindível para manter a pessoa ao seu lado. É um grandioso empreendimento “amar”. Tem que estudar muito, ler os sinais, saber todas as técnicas de sedução, conseguir adivinhar os pensamentos do outro, saber limitar suas ações para não deixar o outro pressionado. Cansa, cansa muito. O mais engraçado é: mesmo colocando tudo em prática, muitas vezes, o outro vai embora. Como tem texto com “dicas” para todos os gostos, fica fácil encontrar uma resposta possível para o motivo da partida. Disponibilidade demais: foi isso. Sinceridade demais: foi isso. A roupa íntima errada: foi isso. Fazer sexo: foi isso. Negar sexo: foi isso. A culpa, em todos os scripts de relacionamento amoroso, é ela o ponto. No acharmos que somos responsáveis pelos estados emocionais dos outros, nos culpamos quando não conseguimos que o outro nos ame como desejávamos. Grande parte do comércio se sustenta baseado nessa crença. Ao acharmos que por não termos sabido ser quem o outro precisava que fôssemos, fomos largados, substituídos ou ignorados. Por que temos a necessidade de entender os motivos para fim de um relacionamento amoroso ao invés de apenas entendermos que acabou? O empreendorismo entrou também nessa área. Formamos pessoas tão inseguras e frágeis emocionalmente que precisamos criar manuais de conquista. Manuais de superação. 10 passos para esquecer o ex. 5 atitudes que farão todos correrem atrás de você. 8 sinais de que ele está a fim. 7 atitudes emocionais que afastam os outros. 3 passos para se tornar irresistível. Esquecemo-nos que aquilo que achamos que estamos vendo no outro (ou em nós) é só nosso julgamento. Batalhamos para manter a chama acesa, para fazermos tudo certinho, imaginando que assim manteremos a pessoa amada ao nosso lado. Lemos que precisamos nos esforçar muito para conseguir, e, depois para manter, mas o amor só é. Não se convence ninguém de te amar. Deneli Rodriguez. 22.08.2017. SEXUALIDADE
Por que afinal damos tanta importância? Somos bombardeados diariamente com a ideia de necessidade do prazer sexual. Dizem-nos que precisamos dele através dos filmes, livros, revistas, programas, conversas. É um assunto muito exposto e debatido, também em meios religiosos. Há versões que condenam o prazer, outras que o estimulam, mas a verdade é que em todas tentam nos convencer que existe uma forma ideal. Todas têm seus conceitos de como deveria ser e ensinam fórmulas para chegar a esse objetivo. Não importa se é um psicólogo, um médico, um guru, um amigo, o que importa é que você, não se encaixando naquele modelo, precisa de ajuda, precisa resolver o problema. Mais uma vez, estou escrevendo sobre padrões sociais. Se a pessoa tem 12, 13 anos e não tem um namorado, precisa ser estimulada a tê-lo. Se a pessoa não liga para o assunto ou não tem vontade de fazê-lo, tem algum problema, precisa ir à terapia, fazer exames, experimentar talvez outra forma de se relacionar sexualmente. Aprendemos que tem algo errado com nós se não nos encaixamos nas esferas de desejo do que nos é vendido como normal, adequado. A pergunta é: por que tem que ser tão importante? A sexualidade é parte natural da vida, assim como andar, comer, dormir, mas, mais uma vez, nos é vendido um esquema de normalidade difícil de perceber, mas que nos movimenta a não estarmos satisfeitos sendo como somos. A cada época existe um padrão sexual, isso é fácil de saber, é só estudar um pouco de história e psicologia. É-nos vendido um esquema de “liberdade” ou de contenção. Pessoas se machucam para sustentar tais modelos. A qualquer época, de qualquer forma, são criados padrões que muitas vezes são confundidos com liberdade. Se em determinada época ser livre é se relacionar com a maior quantidade possível de parceiros e você não tem essa vontade, tem algo de errado com você. Se em outra época, o ideal é monogâmico e você não se encaixa nisso, tem algo de errado com você. Se em outro momento, o ideal é experimentar o desejo sem gênero e você não tem essa vontade, tem algo de errado com você. O ponto aqui é: sempre haverá algum modelo nos sendo imposto, quase sempre num nível inconsciente. É nossa roda de amigos que está vivenciando a sexualidade de uma determinada maneira, as personagens das novelas e dos filmes, as pautas de sexólogos e psicanalistas, somos “informados” o tempo todo na nossa rotina do que é o padrão do momento, quase sempre sem nos darmos conta disso. Liberdade é ser quem você é. É fluir no que te é natural e perceber os padrões de ação das construções mentais. Qualquer esforço na direção do que nos dizem ser correto, cria um conflito interior. Se estivermos num meio em que nos é exigido o celibato, há um conflito. Se estivermos num meio em que nos é exigido nos relacionarmos o tempo todo com um par, há conflito também. A exigência por se adequar ao que se espera, cria sempre conflito, separação. Ao sair de um padrão acaba-se entrando em outro sem perceber. A exigência dos outros ou a nossa em nos esforçamos para nos adequarmos às situações, criam conflito e onde há conflito não pode haver liberdade. Enquanto estivermos tentando alcançar certo fim, estamos buscando o resultado. Se buscarmos um resultado, estamos funcionando através de alguma ideia, crença ou projeção. O que é feito pela mente, pode ser desmantelado a qualquer tempo. É isso o que acontece e é por isso que sofremos. Assim, pois, alguma teoria, ideia ou crença pode ser útil para o descobrimento da realidade? Pode haver investigação quando a mente está presa a um motivo? Permanecendo dentro do padrão nos perguntando o que acontecerá se sairmos dele é uma forma de fuga, uma falsa e inútil maneira de investigar. Quando a mente não está aprisionada, rendida na certeza, nem buscando a certeza, só então se encontra ela num estado de descobrimento. Veja o fato, o que é, e deixai-o atuar, não atue sobre o fato, o “vós”, o mecanismo de repetição com suas opiniões, juízos e conhecimentos. Repetição do que é bom ou mal, do que é nobre ou trivial, redunda em insensibilidade porque a mente só está se movendo nos domínios do conhecido. Assim, todo o esforço, correto ou incorreto, mantém o foco de realização no “eu” construído, na identidade. A manutenção da identidade cria sempre conflito e onde há conflito não pode haver liberdade. Deneli Rodriguez. 14.08.2017. |
AutoraDeneli. Histórico
February 2024
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